Complemento da Ação: PARECER JURÍDICO
Assunto: Análise do Projeto de Lei Nº 103/2025 – Criação do selo "Pet Friend" no Município de Embu das Artes/SP.
Origem: Câmara Municipal da Estância Turística de Embu das Artes.
I. INTRODUÇÃO
Trata-se da análise do Projeto de Lei Nº 103/2025, de autoria da Vereadora Vanessa da Saúde (União Brasil), que propõe a criação do selo "Pet Friend" no Município de Embu das Artes/SP. O objetivo do presente parecer é examinar a constitucionalidade, legalidade e adequação do referido Projeto de Lei à luz da Constituição Federal de 1988 (CF/88), da Constituição Estadual de São Paulo (CE/89), da Lei Orgânica do Município de Embu das Artes (LOM) e do Regimento Interno da Câmara Municipal da Estância Turística de Embu das Artes.
II. OBJETO DA PROPOSIÇÃO
O Projeto de Lei em questão visa instituir o selo "Pet Friend" para identificar e certificar estabelecimentos comerciais que, voluntariamente, permitam a entrada, circulação e permanência de animais de estimação acompanhados de seus tutores no município. O Art. 2º estabelece a adesão facultativa e a fixação visível do selo. O Art. 3º descreve o design do selo, e o Art. 4º declara que a lei não gerará qualquer obrigação ou despesa para o Poder Executivo e a administração pública municipal. A justificativa do projeto ressalta o incentivo à inclusão de animais em ambientes urbanos, o bem-estar animal e o engajamento na preservação dos direitos dos animais, além de reforçar o caráter voluntário e sem ônus para o poder público.
III. FUNDAMENTAÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL
A análise do Projeto de Lei será pautada nos seguintes dispositivos legais:
Constituição Federal de 1988 (CF/88):
Art. 30, inciso I: Confere aos Municípios a competência para "legislar sobre assuntos de interesse local".
Art. 30, inciso II: Atribui aos Municípios a competência para "suplementar a legislação federal e a estadual no que couber".
Art. 37, caput: Estabelece que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Constituição Estadual de São Paulo de 1989 (CE/89):
Art. 1º: Reafirma que o Estado de São Paulo "exerce as competências que não lhe são vedadas pela Constituição Federal", estendendo-se, por analogia, a lógica da não vedação para as competências municipais no que tange ao interesse local.
Art. 111: Repete os princípios da administração pública do Art. 37 da CF/88, acrescentando razoabilidade, finalidade, motivação e interesse público.
Lei Orgânica do Município de Embu das Artes (LOM):
Art. 8º, inciso XVIII: Confere ao Município a competência para "ordenar as atividades urbanas, fixando condições e horário para o funcionamento de estabelecimentos industriais, comerciais, de prestação de serviços e similares".
Art. 9º, inciso X: Prevê a competência concorrente do Município para "incentivar o turismo como atividade econômica geradora de recursos, bem como os setores interligados".
Art. 13: Reitera que "Cabe à Câmara Municipal legislar sobre assuntos de interesse local, observadas as determinações e a hierarquia constitucional, bem como suplementar a legislação Federal e Estadual".
Art. 195, §1º: Afirma que a ordem social visa o bem-estar social dos cidadãos e a promoção do desenvolvimento sustentável.
Art. 47: Dispõe sobre a vedação de aumento de despesa em projetos de iniciativa privativa do Prefeito, mas a regra geral se aplica a qualquer projeto que gere despesa.
IV. ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE E LEGALIDADE
IV.1. Competência Legislativa Municipal
A proposição de criação do selo "Pet Friend" parece inserir-se na competência legislativa municipal. Conforme o Art. 30, inciso I, da CF/88 e o Art. 13 da LOM, os Municípios têm autonomia para legislar sobre "assuntos de interesse local". A regulação da convivência entre animais de estimação e estabelecimentos comerciais, impactando o turismo local e a dinâmica social e econômica da cidade, pode ser claramente enquadrada como um assunto de interesse predominantemente local.
Adicionalmente, a LOM, em seu Art. 8º, inciso XVIII, confere ao Município a prerrogativa de "ordenar as atividades urbanas, fixando condições e horário para o funcionamento de estabelecimentos industriais, comerciais, de prestação de serviços e similares". A instituição de um selo como o "Pet Friend", ainda que de adesão voluntária, é uma forma de ordenar e incentivar práticas dentro do comércio local, o que se alinha com essa competência. O Art. 9º, inciso X da LOM, que trata do incentivo ao turismo, também corrobora essa interpretação, visto que a qualificação de estabelecimentos como "Pet Friend" pode atrair turistas e fomentar a economia local.
A matéria não parece conflitar com a legislação federal ou estadual existente, nem invadir competências de outros entes federativos. Portanto, a Câmara Municipal de Embu das Artes possui competência para legislar sobre o tema.
IV.2. Princípios Administrativos e Orçamentários
Um ponto crucial do Projeto de Lei é o seu Art. 4º, que afirma: "Esta lei não gera qualquer obrigação para o poder Executivo e sua implementação não acarretará despesas para a administração pública municipal." A justificativa do projeto reforça que "a medida é voluntária, sem gerar obrigações financeiras ou administrativas para o poder público."
Embora a intenção seja nobre e a medida proposta seja de adesão voluntária pelos estabelecimentos, a criação de um "selo" por um ente público, para que seja efetiva e atinja seus propósitos (identificar e certificar), invariavelmente, demandará alguma atuação da administração pública. Tais atuações podem incluir, mas não se limitam a:
Design e padronização do selo: Embora o Art. 3º descreva o design, a sua criação final e padronização exigem trabalho de design gráfico e aprovação, que pode ser feito por pessoal interno ou por contratação, gerando despesa ou alocando tempo de servidor.
Divulgação e promoção: Para que o selo seja reconhecido e tenha utilidade, o poder público municipal, ou ao menos a Câmara, terá interesse em divulgá-lo. Campanhas, mesmo que mínimas, geram custos (impressão, veiculação, tempo de pessoal).
Gestão das adesões: Mesmo sendo voluntária, a adesão implicará em algum processo de registro ou controle dos estabelecimentos participantes. Isso pode requerer a criação de um cadastro, o recebimento de solicitações, a verificação de conformidade (mesmo que mínima, como a correta afixação do selo), e a emissão do selo físico ou digital. Essas atividades demandam recursos humanos e materiais.
Fiscalização (mesmo que mínima ou reativa): Para garantir a credibilidade do selo, o Município pode precisar, ainda que de forma reativa, verificar se os estabelecimentos que exibem o selo de fato cumprem as premissas (permitem a entrada de pets). Isso pode gerar demandas para órgãos de fiscalização já existentes.
A CF/88, em seu Art. 37, estabelece os princípios da administração pública, incluindo a eficiência e a legalidade. A CE/89, no Art. 111, e a LOM também os replicam. Um projeto que, em sua essência, cria uma nova atribuição para a administração, mesmo que de forma "voluntária" para o aderente, precisa ter clareza sobre como será gerido para não implicar em desvio de finalidade de recursos existentes ou em atividades realizadas sem respaldo orçamentário e de pessoal.
A declaração de que "não acarretará despesas para a administração pública municipal" (Art. 4º do PL) é uma tentativa de blindar o projeto de vícios de iniciativa ou de impacto orçamentário. Contudo, em uma análise rigorosa, a implementação de qualquer política pública, mesmo que pequena e sem a criação de novas estruturas, sempre mobiliza recursos humanos ou materiais já existentes, o que representa um custo indireto. A ausência de dotação orçamentária específica para o selo pode ser interpretada como uma omissão que desrespeita o Art. 165 da CF/88 e o Art. 174 da CE/89, que tratam das leis orçamentárias e da necessidade de indicação de recursos para despesas. A LOM também aborda a necessidade de previsão orçamentária para despesas em seu Art. 47.
Embora o projeto não crie novas Secretarias ou cargos, a alocação de tempo de servidores e uso de infraestrutura existente para gerenciar o selo pode ser vista como uma "despesa" não explicitada. A justificativa do projeto, ao afirmar que a medida é "sem gerar obrigações financeiras ou administrativas para o poder público", tenta contornar essa questão, mas a prática pode revelar o contrário.
IV.3. Mérito da Proposição
Do ponto de vista do mérito, a proposta é socialmente relevante e alinhada com as tendências de convivência com animais de estimação em espaços urbanos. O incentivo à inclusão de animais em ambientes comerciais, conforme mencionado na justificativa, pode promover o bem-estar animal e fomentar o comércio local. A criação de um selo que identifica esses estabelecimentos facilita a vida dos tutores de pets e promove uma imagem positiva do Município como "Pet Friend", o que se coaduna com a natureza de "Estância Turística" de Embu das Artes, conforme o Art. 9º, inciso X, da LOM.
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES
O Projeto de Lei Nº 103/2025 possui mérito relevante e se insere, a princípio, na competência legislativa do Município de Embu das Artes. No entanto, o Art. 4º, ao afirmar que o projeto não gerará despesas ou obrigações para o Poder Executivo, pode ser problemático na prática.
Embora não crie novas estruturas ou cargos, a implementação de um selo como o "Pet Friend" demanda alguma atividade administrativa (mesmo que pequena) por parte da Prefeitura, seja na divulgação, no controle das adesões, ou na emissão do selo. Essas atividades, inevitavelmente, implicarão em custos (diretos ou indiretos, como tempo de pessoal e uso de recursos públicos) que deveriam, idealmente, ter algum tipo de previsão, ou ao menos uma clara delegação de responsabilidade a um setor existente para absorver essa demanda sem prejudicar outras atividades.
Recomendação:
Diante do exposto, este parecer jurídico recomenda a aprovação do Projeto de Lei Nº 103/2025, considerando a sua relevância social e o seu enquadramento na competência municipal para legislar sobre assuntos de interesse local e incentivo ao turismo.
Contudo, recomenda-se que, durante a fase de implementação da lei, caso seja sancionada, o Poder Executivo avalie cuidadosamente os recursos e o tempo de pessoal dedicados à gestão do selo "Pet Friend" para garantir que não haja impacto financeiro ou administrativo significativo não previsto. Alternativamente, a Câmara Municipal poderia, em futuras etapas legislativas, considerar a inclusão de um artigo na lei que especifique o órgão ou secretaria responsável pela gestão do selo, bem como a possibilidade de buscar parcerias com a iniciativa privada para o custeio de sua promoção e distribuição, minimizando assim o impacto nos recursos públicos.
Este é o parecer, salvo melhor juízo.
Atenciosamente,
HÉLIO DA COSTA MARQUES
MATR. 1166
OABSP 301102
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